Em tempos de viralização e julgamento sem empatia, quem tem sabedoria para se construir uma imagem positiva é rei.
Não é a primeira vez que alguém da área da Saúde me liga e diz:
– Liv, estou com um problema sério com a minha equipe.
Durante a conversa, o assunto é quase sempre o mesmo: a forma como os profissionais lidam com as redes sociais. No ano passado, fiz algumas palestras sobre o tema tão importante a todos profissionais e, principalmente, ao pessoal da Saúde que sofre mais este conflito entre suas personas. A última foi para o Seminário de Comunicação da Faculdade de Saúde Pública da USP.
Antigamente, quando não havia virtualidade, as pessoas acordavam, se vestiam com suas roupas de trabalho, iam executar suas funções, se relacionavam com os colegas profissionais e, ao final da jornada, voltavam, entravam em casa, tiravam a roupa que representava a sua profissão, e, só então, passavam a se relacionar pessoalmente, em sua intimidade.
Eram dois ambientes bem separados. E passavam-se meses ou anos para os colegas saírem do ambiente de trabalho e adentrarem no íntimo, tornando-se amigos. O processo era lento e demorado. E quando havia esta mudança de relacionamento (profissional para o pessoal), ambas as partes já tinham adquirido conhecimento suficiente que poderiam dar o próximo passo com bastante segurança. Afinal, a intimidade era criada aos poucos e o tempo ditava a equação.
Havia também uma outra forma de interação. Nos primórdios da Internet, as pessoas precisavam primeiro conhecer aquela empresa, pessoa ou instituição no real, para depois validar a sua virtualidade.
Só que o advento do virtual transformou todos estes cenários. As mídias sociais impedem (por mais que você tente) que você tenha uma vida profissional completamente separada da pessoal e quando você conhece alguma empresa ou quer saber sobre alguém, você dá um Google para ver o que falam a respeito do nome pesquisado. Ou seja, as pessoas vão para a Internet para validarem o que conheceram na realidade.
E, então, você contra argumenta:
– Ué, muito simples, é só não ter mídia social. Ou deixar tudo no privado, convidando somente os amigos bem pessoais.
Bem, por mais que soe estranho, o fato é que você não precisa estar na mídia social para estar na mídia social. Se você lidar com algum cliente, paciente ou qualquer pessoa do seu ambiente profissional e esta pessoa quiser fazer uma crítica a você no Facebook dela, por exemplo, você já estará na mídia social formando uma imagem negativa de seu avatar e, o pior, sem saber o quê estão falando de você ou ter a chance de se defender.
– Avatar, Liv? Que exagero.
Eu não sei se você reparou, mas aquilo que você faz na virtualidade vira a tua representação, o seu eu virtual ou, como carinhosamente chamo, o seu Avatar. Então, você pode não se machucar fisicamente, mas o que o seu Avatar fizer, você pode sentir sim – e muito – na pele. Sinto lhe dizer, mas não há época mais perigosa de ter seu Avatar colocado na fogueira como nos dias de hoje.
Casos mais graves acontecem com os grupos de Whatsapp. O que seria uma ferramenta inicialmente utilizada entre profissionais para facilitar a discussão dos casos e acelerar a elaboração do plano terapêutico do paciente e suas possíveis formas de tratamento, se transformou em A Fantástica Fábrica de Prints.
Quero acreditar que os tropeços virtuais acontecem pela inocência ou ignorância do poder desta mídia. Várias vítimas de A Fantástica Fábrica de Prints relataram que havia uma sensação de estar teclando com seus amigos mais íntimos uma vez que conhecia alguns dos tantos participantes.E, inconscientemente e automaticamente, supunham que todos os integrantes eram semelhantes no pensar, julgar ou agir – eu chamo esta suposição de A Grande Ilusão da década.
E, como era de se esperar, a história que conhecemos de cór se repete. Se o grupo não for utilizado com a devida atenção e for compartilhada alguma selfie comprometedora, um comentário não pensado, uma piada mal colocada, uma foto divulgada sem permissão ou qualquer outro deslize, a chance deste tropeço, dependendo do conteúdo, virar um print, viralizar e cair no mundo em poucas horas é gigantesca.
Destes exemplos, vamos começar pela bendita selfie. Muitas são feitas em ambiente de trabalho, expondo o paciente. E, todos sabemos, o paciente deve ser sempre protegido. Sei, conversando com as vítimas de A Fantástica Fábrica de Prints, que muitas selfies foram feitas ingenuamente. Por mais estranho que pareça, muitos não se deram conta que tinha algum paciente saindo na foto muito menos pensaram que aquele retrato poderia ser anti-ético. O fato é que a rapidez da Internet e os atos sem pensar são uma péssima combinação moderna. Prints com comentários que exponham qualquer tipo de preconceito, posição extremista ou posts irrelevantes para a sua construção profissional são outras infelicidades que vira e mexe vejo acontecer na rede e são fatais.
A consequência destes deslizes? O profissional da Saúde, por lidar com vidas, além de sofrer a perda de credibilidade por ter seu Avatar exposto, pode sofrer injúrias que serão difíceis de consertar em um futuro próximo, podendo perder até o direito de exercer a sua profissão. Os conselhos que regem a saúde são atuantes e possuem uma série de regras que devem ser seguidas à risca.
Calma, nem tudo são lágrimas. Há muitos e muitos sorrisos no caminho. Se você souber usar as mídias sociais e ferramentas virtuais com estratégia e inteligência, poderá sentir uma espécie de massagem positiva no ego de seu Avatar, o que refletirá em credibilidade e status em sua realidade. Seria bom, não seria?
– E como se faz isto, Liv?
Você precisa pesar primeiro o que vale mais: construir uma imagem institucional promissora ou se concentrar na divulgação da sua vida pessoal? Dá para fazer os dois, mas eu sempre digo que nunca vale a pena escancararmos a nossa intimidade ao extremo, porque, como disse acima, você nunca irá conhecer realmente todo mundo que acessa a sua página e não sabe qual a intenção dela ou a forma que ela tem para receber ou interpretar o seu post.
O problema não é postar uma foto ou outra de balada, mas sim quando só se posta foto de um único tema. A construção do seu eu real e do seu eu virtual dependem de você. Assim como você representa no seu dia a dia vários papéis, precisa passar isto também para as mídias sociais. Caso contrário, criará um Avatar que não te retratará por completo e, então, seus seguidores ficarão confusos com o que você passa no virtual versus o seu real. O que afetará negativamente o seu futuro ou até mesmo, dependendo do abismo entre estas representações, o seu presente.
Definições do conceito dos graus do que é intimidade ou a forma de temperar bem a construção do seu Avatar com a proteção e sucesso do seu eu real ficarão para outro artigo. O objetivo neste texto aqui era dar um primeiro passo, o da compreensão. Entenda: não se pode mais separar as duas dimensões. E ter consciência deste cenário é necessário para se construir uma imagem com sabedoria e colher bons frutos ao invés de algo estragado. Lembre-se: sempre há uma trajetória suave que você pode escolher e o meu desejo em 2018 é que os seus caminhos – virtual e real – vivam em harmonia, sejam bonitos, macios e prósperos.
Liv Soban é Estrategista de Marca. Com participação ativa em negociações com clientes e sólido conhecimento em Comunicação interna, externa e, também, nas relações com a imprensa, atua na elaboração, construção e desenvolvimento de Marcas, bem como Planos de Marketing e Comunicação. Executa a gestão do Planejamento estratégico, inclusive no fortalecimento da relação da empresa com seus stakeholders. Graduada em Jornalismo pela Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, cursou especializações relacionadas a Marketing e Comunicação em instituições como FGV, Universidade de Illinois, Universidade de Amsterdã, Bocconi, IBMEC e USP.